segunda-feira, setembro 17, 2007

O alegado canibal

E aninhado no berço das suas costelas, eis que jaziam os restos dispersos de outro Coelophysis, que era ainda bastante jovem. E todos os que olharam ficaram maravilhados, pois acreditaram que este era o fóssil de uma mãe e da sua cria por nascer. Mas o Dr. Colbert estudou esses ossos, e proclamou que a criança na sua barriga era grande e bem formada; e que não sairia sem dano pelo corpo de uma mãe. E então todos se calaram, pois o que tinham julgado ser um símbolo da maternidade tinha sido revelado como uma antiga relíquia de canibalismo.

Este é o final do The Coelophysis Maddona, um texto escrito em 2004 por Matt Celeskey. Aconselho a ida à página onde se pode ver um detalhe de uma ilustração assaz perturbadora de uma mãe Coelophysis que devora o filho que embala nos braços. Esta reputação de canibal do Coelophysis bauri viria a tornar-se numa presença quase obrigatória nos livros de divulgação sobre dinossauros, e nas exibições em museus. Um exemplo é esta imagem de um modelo animatrónico, do Museu de História Natural de Londres, de cuja boca pende um dos seus congéneres de tenra idade.[... ler mais]

Centenas de Coelophysis foram desenterrados em 1947 no Rancho Fantasma (Ghost Ranch) no Novo México, alguns deles bastante completos e articulados. Ao preparar estes dois indivíduos, o tal doutor Colbert notou algo de curioso, que viria a descrever no final da década de 1980.

Dentro destes animais, que terão vivido no Triásico, cerca de 228 milhões da anos atrás, o doutor Colbert encontrou inúmeros pequenos ossos que pareciam encontrar-se nos locais correspondentes às cavidades corporais. Esses ossos eram de origem arcossauriana e o tal doutor Colbert deduziu, sem grandes justificações, que se trataria de juvenis de Coelophysis consumidos pelos seus congéneres de maior idade. De tal forma ficou convencido, que afirmou, em livros publicados em 1989 e 1995, com grande certeza, que isto era evidência inequívoca de canibalismo nos dinossauros. O rótulo de canibal foi amplamente popularizado em artigos de divulgação e colou-se, não só ao Coelophysis, mas aos terópodes em geral.

Ora, trabalho mais recente, veio mostrar que afinal a tal evidência inequívoca era equívoca, ou seja a história do ovirraptor como que se repetiu novamente. Esse será o tema próxima contribuição.

Ficha técnica
Imagem de modelo animatrónico cortesia de user:Ballista via Wikimedia Commons.

Referências
(ref1) Colbert, E. H. (1989). The Triassic dinosaur Coelophysis. Mus. North. Arizona Bull. Ser. 57, 1­160.
(ref2) Colbert, E. H. (1995). The little dinosaurs of Ghost Ranch. New York, NY: Columbia University Press.

3 comentários:

João Carlos disse...

Eu sei que a matéria ainda não está completa, mas, com efeito!... Depois reclamas que eu não tenho o devido respeito por um biólogo sul-africano que anda a propalar sua hipótese (nitidamente de foro racista) sobre a suposta "estupidez" dos golfinhos...

Caio de Gaia disse...

Nestas coisas o indivíduo que faz a descoberta tem direito a especular e a publicar a sua versão da história de faz-de-conta. Depois compete a outros cientistas mostraram que aquela não serve e que deve ser substituída por outra.

Eu no fundo até espero os golfinhos não sejam tão espertos como isso. É que nesse caso teriam que deixar de ser considerados como "simples animais".

Há aspectos do comportamento deles que teriam que ser considerados como maldade extrema. Nem sempre são animais simpáticos. Não comem os seus jovens mas não hesitam em matá-los.

Eu tenho essa contribuição em lista de espera, mas talvez seja altura de a colocar.

João Carlos disse...

Há aspectos do comportamento deles que teriam que ser considerados como maldade extrema. Nem sempre são animais simpáticos. Não comem os seus jovens mas não hesitam em matá-los.

Então, seriam muito semelhantes a outra espécie de mamífero, considerada como "sapiente" que, entre outras coisas, inventou a tortura... Infelizmente, "inteligência" e "bondade" nem sempre andam de mãos dadas...