quinta-feira, dezembro 21, 2006

Nem sempre duas cabeças são melhores que uma

Se a descoberta dos dragões cem por cento meninos de sua mãe já parecia supreendente, eis algo que não deixa também de ter o seu quê de inesperado. Um grupo de paleontólogos descobriu, na China, um ninho com 140 milhões de anos onde se encontrava este fóssil de um bebé de um grupo de répteis já extintos chamados coristodérios. Pertencente à espécie Hyphalosaurus lingyuanensis, o fóssil, com apenas 7 centímetros de comprimento, está bastante completo. Na verdade apresenta-se completo até de mais. Do que é que estou a falar? Reparem bem na imagem. Vemos uma cauda, dois membros posteriores, dois membros anteriores, dois pescoços, duas cabeças. Enfim o usual, afinal quem é que nunca descobriu um réptil fóssil com duas cabeças? [... ler mais]

A descoberta de Eric Buffetaut e colegas teve honras de artigo na revista Biology Letters (ref1). Numa tradução livre do resumo bastante curto:

Descreve-se um embrião ou neonato com malformação de réptil coristodério do Cretácico Inferior da Formação de Yixian no nordeste da China. O pequeníssimo esqueleto exibe duas cabeças e dois pescoços, com uma bifurcação ao nível da cintura escapular. Esta é a primeira ocorrência, num fóssil, da malformação conhecida como bifurcação axial, que é bem conhecida em répteis vivos.

Já tinha visto imagens de cobras e até de tartarugas de duas cabeças. Encontrar isto num fóssil é um pouco como ganhar a lotaria.

Crânios em Marte, nascimentos virgens em dragões, coristodérios de duas cabeças. Este blog nos últimos tempos parece um daqueles jornais do incrível e do fantástico. Acho que está na altura de tirar umas férias.

Adenda (7 Janeiro 2007). Esta descoberta não é polémica. No ninho havia mais fósseis de coristodérios, todos com um pescoço e uma cabeça apenas. Este animal resultou de um mau desenvolvimento embrionário, algo que nos répteis actuais é raro mas acontece. Há registos de qualquer coisa como 400 cobras de duas cabeças.

Referências
(ref1) Eric Buffetaut, Jianjun Li, Haiyan Tong, He Zhang (2006). A two-headed reptile from the Cretaceous of China. Biology Letters. Laço DOI.

quarta-feira, dezembro 20, 2006

O Mundo do Hobbit: dragões filhos da mãe

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A ratazana gigante das Flores não foi o único gigante contemporâneo dos hominíneos floresienses a sobreviver até hoje. No mundo do hobbit existiam dragões, lagartos gigantes da espécie Varanus komodoensis, os predadores no topo da cadeia alimentar nas Flores e nalgumas ilhas vizinhas. Com cerca de três metros de comprimento, e pesando por volta de 70 kg, deviam parecer ainda mais aterradores aos diminutos floresienses do que nos parecem a nós. Ora nesta época natalícia foi desvendado um mistério relativo ao nascimento destes animais. Parece que o pequenito da figura não tem pai, ou melhor, que o seu pai é a sua mãe. Descobriu-se agora que nesta espécie fêmeas virgens podem dar luz ninhadas só de meninos. [... ler mais]

Este espécie de milagre reptiliano é descrita num artigo de Phillip C. Watts e colegas na revista Nature (ref1) desta semana. Numa tradução livre do resumo:
Deverão machos e fêmeas serem guardados juntos para evitar o despoletar do nascimento virgem nestes répteis ameaçados?

A partenogénese, a produção de descendência sem fertilização por um macho, é rara nas espécies vertebradas, que usualmente se reproduzem após fusão de gâmetas masculinos e femininos. Usamos aqui impressões genéticas para identificar descendência partenogenética produzida por dois dragões Komodo fêmeas (Varanus komodoensis) mantidos em insituições separadas e isoladas dos machos; subsequentemente uma dessas fêmeas produziu descendência adicional de forma sexuada. Esta plasticidade reprodutiva indica que os dragões fêmeas podem trocar entre reprodução sexuada e assexuada, dependendo da disponibilidade de um parceiro — uma descoberta que tem implicações para a reprodução em cativeiro desta espécie ameaçada. Muitos zoológicos mantêm apenas fêmeas, sendo os machos transferidos entre zoológicos para acasalarem, mas talvez devessem ser mantidos juntos para evitar o despoletar da partenogénese, e a redução da diversidade genética.

Uma das fêmea, a já falecida Sungai, que vivia no Jardim Zoológico de Londres, tinha causado surpresa ao produzir 22 ovos, 4 dos quais viáveis, cerca de dois anos e meio após ter estado com um macho. Na altura pensou-se que os dragões fêmeas talvez fossem capazes de armazenar esperma durante longos períodos de tempo. Só que um acontecimento recente mostrou que não foi isso que sucedeu.

No Jardim Zoológico de Chester, no Reino Unido, vive uma outra fêmea, a Flora. Ora esta fêmea nunca esteve com um macho, mas isso não a impediu de produzir 25 ovos, dos quais 11 pareciam viáveis e foram colocados para incubação. Três desses ovos quebraram-se e a análise genética desses ovos mostrou aquilo que se esperava: eram todos filhos apenas da mãe. A análise dos embriões da Flora, e dos descendentes da Sungai mostrou que os animais produzidos na ausência de um parceiro eram partenogenéticos: o genótipo reconstruído a partir dos descendentes era o das mães.

Reprodução assexuada não que no entanto dizer clones, ou seja cópias exactas da mãe. O óvulo é uma estrutura haplóide, isto é, possui apenas um cromossoma de cada par que existia originalmente na mãe. Na reprodução sexuada o espermatozóide, também haplóide, contribui com um cromossoma de cada par existente no pai para formar um organismo em que os cromossomas vêm aos pares, ou seja diplóide. O que sucede na partenogénese dos dragões é que o óvulo é acompanhado por uma célula, um dos corpos polares, que tem exactamente os mesmos cromossomas. Em geral essa célula degenera, mas no processo partenogenético em vez disso funde-se com o óvulo, dando origem a um ovo fertilizado. Os animais assim produzidos são completamente homozigóticos, ou seja os cromossomas num par são idênticos. Isso acarreta uma consequência curiosa: todos os dragões produzidos neste processo são machos. Nos dragões os cromossomas sexuais são designados por Z e W, e são as fêmeas que têm ambas as formas, são ZW, enquanto os machos são ZZ. Como resultado do processo de partenogénese os cromossomas são duplicados, ou seja produzem-se ZZ ou WW (não viáveis), logo nenhumas fêmeas.

O mecanismo tem algum valor adaptativo. Uma fêmea isolada pode reproduzir-se assexuadamente dando origem a um grupo de machos com os quais pode depois retomar um processo de reprodução sexuada. É um processo apesar de tudo raro nos vertebrados. Ocorre, por exemplo, nalgumas espécies de cobras e lagartos.

Os oito bebés da Flora são esperados nos próximos dias. Trata-se de um verdadeiro conto de Natal.

Referências
(ref1) Phillip C. Watts, Kevin R. Buley, Stephanie Sanderson, Wayne Boardman, Claudio Ciofi and Richard Gibson (2006). Parthenogenesis in Komodo dragons. Nature 444, 1021-1022. Laço DOI.

A mãe dedicada, as larvas e o grilo que salvou o Natal

Tenho uma série de contribuições prometidas, mas não podia deixar passar o espírito da quadra. O Natal é uma época em que se contam histórias edificantes, com exemplos de amor e abnegação, e sobretudo com finais felizes. Sendo assim nada melhor que uma série de contribuições dedicadas ao amor materno. A heroína na série de contribuições que vou iniciar hoje, e que se vão prolongar por alguns dias, é a pequena mosca da figura, a Ormia ochracea. Trata-se de uma fêmea, que no seu interior transporta uma série de amorosas larvas, suas filhas. Com qualquer mãe que se preze esta mosca quer apenas o melhor para as suas filhas: um local seguro, onde não lhes falte nada e possam crescer gordas e saudáveis, até se transformarem em lindas pupas. Para isso precisa da "ajuda" de um grilo. É que a O. ochracea é uma mosca parasítica e o grilo está destinado a ser o hospedeiro da sua família. [... ler mais]

Para começar nada melhor que mostrar alguma imagens dos bebés que só pedem que os deixem crescer. Que mãe mosca conseguiria resistir a estas carinhas?
Uma vez encontrado um grilo à mão de semear as larvas não se fazem rogadas e tratam de se meter lá dentro. Têm direito a pensão completa: o grilo vai "fornecer" cama e comida durante uns poucos dias.
Pode parecer uma habitação pequena mas tem muita arrumação e a comida não parece ser má. Há de que ficar embevecido quando se vê o aspecto rechonchudo e feliz destas pequenitas. Vejam mais de perto e digam lá se os insectos não conseguem ser amorosos?
Infelizmente os dias da infância, e sobretudo os tecidos do grilo, não duram para sempre. Foi bom enquanto durou, mas após menos de uma semana é preciso largar o lar e abraçar o mundo.
À saída segue-se a fase de pupa, a preparação para a vida de adulta. Essa transição marca o final deste primeiro conto, com vários finais felizes como se pode ver pelas três pupas na imagem da direita, e pela larvazita que se apresta a juntar-se às irmãs.
Esta foi uma história bonita, de uma mãe que conseguiu um tecto e alimento para as suas esfomeadas crias. Mas o espírito da época não se esgota aqui. Para conseguir encontrar este lar tão acolhedor a mãe mosca usa uma capacidade extraordinária, que pode vir a ajudar muitos seres humanos. Não percam amanhã mais um conto natalício com a Ormia ochracea, em que tudo se revela uma questão de ouvido.

Ficha técnica
Imagem da Ormia ochracea juntamente com o grilo cortesia de Ronald Hoy na Universidade de Cornell retirada das páginas de Andrew Mason na Universidade de Toronto. Foi nessas páginas que encontrei também um filme, cortesia de Andrew Mason, do qual retirei as restantes imagens.

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Os velhos conodontes não morrem, apenas perdem apatite

A paleontologia é um daqueles ramos da ciência em que convém não ser impaciente. Por vezes é preciso esperar muito tempo pelo fóssil certo, nalguns casos mais de um século. Isso vem a propósito da minha revisão da literatura sobre o Homo floresiensis. Quando me sentia um pouco desapontado por pouco se ter avançado desde a descoberta, lembrei-me de um senhor chamado Christian Heinrich Pander (1794-1865). É que Pander descreveu, em 1856, um grupo de fósseis extraordinariamente abundantes, encontrados em quase todos os sedimentos marinhos do Paleozóico, os conodontes, dos quais mostro um exemplo na imagem. Estas coisas, que parecem pequenas mandíbulas, com uns poucos milímetros de comprimento, foram durante muito tempo um dos grandes verdadeiros mistérios da paleontologia. Os dentículos eram a única parte dura dos conodontes, e a verdadeira forma dos organismos a que pertenciam permaneceu no domínio da especulação durante quase 130 anos. [... ler mais]

O desconhecimento da biologia dos conodontes não interferiu com o trabalho da maioria dos conodontólogos, mais interessados em bioestratigrafia. É que estes dentículos, os chamados elementos conodontes, são de tal forma comuns que podem ser utilizados como ferramenta geológica de datação. São particularmente utilizados na exploração de petróleo, pois a matéria que os constitui altera a cor com a temperatura a que se formou a rocha que os acompanha, pelo que permitem também reconstruir a história dos sedimentos. Retêm ainda informações importantes para caracterizar os oceanos em que viviam, sendo importantes na reconstrução dos ambientes marinhos do passado. Na verdade, são tão úteis como indicadores que se publicam todos os anos centenas de artigos usando informação obtida a partir dos elementos conodontes. Contudo, no que se refere ao conhecimento das criaturas propriamente ditas, durante muito tempo não se avançou grande coisa.

A biologia dos conodontes era um ramo com pouca expressão até há cerca de 20 anos atrás. Tudo mudou em 1983, com a descoberta por Briggs, Clarkson, e Aldridge (ref1) de um conjunto de fósseis, na Escócia, que mostravam impressões de tecidos moles aos quais estavam inequivocamente associados os dentículos típicos dos conodontes. A criatura que esclareceu finalmente o mistério foi este Clydagnathus windsorensis, com apenas cerca de 40 milímetros de comprimento.

O C. windsorensis mostrava vestígios de uma protuberância, uma "cabeça", onde se encontravam os elementos conodontes, um tronco dividido numa série de segmentos musculares em forma de V, e uma região caudal que mostrava a presença de raios sugestivos de uma barbatana caudal. Eis aqui em baixo uma ampliação da região da cauda (topo) e do tronco (base).

O tronco apresenta duas linhas paralelas que são um pouco difíceis de interpretar. Não parecem estar relacionados com o tubo digestivo mas sim serem vestígios de uma notocorda. A notocorda é uma espécie de tubo flexível que existe nos embriões de todos os cordados. Nalguns cordados mais "primitivos", como o anfioxo, permanece ao longo da vida do animal, fornecendo apoio para os músculos. Nos vertebrados ditos superiores, é substituída pela coluna vertebral.

Uma das características importantes dos conodontes é a existência de uma cabeça que se distingue bem do corpo do animal.

A cabeça é flanqueada por duas estruturas escuras que a maioria dos investigadores identificam como sendo olhos. Os dentículos encontravam-se em vida na frente da boca, isto é, eram um mecanismo de captura e aquisição de alimento. Mostra-se abaixo uma reconstrução possível do C. windsorensis:

A maioria dos investigadores assume hoje em dia que os conodontes pertençam aos cordados, embora a posição na filogenia seja algo incerta. Análises detalhadas dos dentículos, formados por apatite (fosfato de cálcio), mostraram no entanto uma clara analogia ao tecido ósseo celular dos vertebrados. Isto foi na altura uma grande surpresa pois admitia-se até então que o tecido ósseo dos vertebrados tivesse a sua origem nas couraças ósseas dérmicas que surgiram nalguns tipos de peixes sem mandíbulas. Neste momento tudo indica que os conodontes se incluam entre os vertebrados e as teorias para o aparecimento e evolução do esqueleto vertebrado têm vindo a ser revistas. A presença do tecido ósseo celular sugere que ou se trata de um traço ancestral dos vertebrados, perdido nos ciclóstomos (lampreias e mixinas) ou, mais provável, que os conodontes sejam parentes mais próximos dos vertebrados com mandíbulas do que dos ciclóstomos. Devo salientar, no entanto, que há contudo outros pontos de vista, quer quanto à reconstrução do animal (os "olhos" poderiam ser simples apoios cartilaginosos para o aparelho bucal), quer quanto às afinidades com os cordados.

Pander, na altura da descoberta, considerou os elementos conodontes como vestígios de um grupo de peixes até então desconhecido, e parece que afinal sempre tinha razão. Foram um grupo de animais com um sucesso incrível: duraram qualquer coisa como 300 milhões. Parte desse sucesso estaria seguramente relacionado com a função do seu dispositivo bucal, mas isso terá que ficar para uma outra contribuição.

Ficha técnica
Imagem do conodonte no início da contribuição retirada desta página da U.S. Geological Survey, do U.S. Department of the Interior.
Outras imagens e inspiração para o texto a partir do artigo de Sweet e Donoghue indicado abaixo como ref2.

Referências
(ref1) Briggs, D. E. G., Clarkson, E. N. K. & Aldridge, R. J. (1983). The conodont animal. Lethaia 16, 1-14.
(ref2) WALTER C. SWEET AND PHILIP C. J. DONOGHUE (2001). CONODONTS: PAST, PRESENT, FUTURE. J. Paleont., 75(6), pp. 1174-1184.

quarta-feira, dezembro 13, 2006

Requiem por um golfinho

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Esta é uma ilustração do golfinho fluvial chinês, conhecido localmente por baiji, de seu nome científico Lipotes vexillifer, um parente próximo do boto-vermelho do Amazonas. Alcunhado de "Deusa do Yangtzé", essa designação tem a ver com o facto de existir apenas nesse rio. Descobri hoje que o mais correcto na frase anterior teria sido dizer "que existia", porque muito provavelmente o baiji terá desaparecido da face da Terra nos últimos dois anos. [... ler mais]

A Fundação baiji.org anunciou hoje, dia 13 de Dezembro de 2006, nas suas páginas na internet a triste notícia. Esta é a conclusão de um levantamento exaustivo do Yantzé onde participaram mais de 30 investigadores de seis países. Não foram vistos animais nem foram escutadas vocalizações. Em 1950 existiriam cerca de 6,000 destes golfinhos. Em 1980 não restariam mais de 400 animais. Um censo em 1997 produziu apenas 13 avistamentos confirmados. Em 2006, veio então o momento temido, mas não inesperado. De acordo com um dos organizadores da expedição, August Pfluger, que dirige a Fundação baiji.org:
É possível que nos tenham escapado um ou dois animais. Temos que aceitar o facto de que o baiji esteja funcionalmente extinto. É uma tragédia, uma perda não apenas para a China, mas para o mundo inteiro.

Ainda August Pfluger, numa nota mais emotiva, quando se referiu a um vídeo que observou de Qi Qi, um macho salvo em 1980 e que morreu no cativeiro em 2002:
Considero-me um homem forte. Mas quando vi o filme chorei durante alguns minutos. É algo tão terrivelmente triste.
Adeus lindo golfinho.

Ficha técnica
Ilustração do baiji cortesia de Alessio Marrucci, desta página da Wikimedia Commons.
Uma das citações de August Pfluger, e alguma da informação referida neste texto, foram retiradas de um comunicado na Fundação baiji.org.
A outra citação foi retirada deste texto na National Geographic, onde se pode ver uma foto de Qi Qi.

segunda-feira, dezembro 11, 2006

Passeio a dois

Esta é uma imagem que vem do Mar Vermelho. O peixe grande e robusto é uma garoupa, da espécie Plectropomus pessuliferus. O peixe menor e escondido num buraco na rocha é uma moreia, da espécie Gymnothorax javanicus. A garoupa está com fome, fome essa que a levou a procurar a moreia. Curiosamente o desfecho da história não é o que estamos à espera, a moreia não está prestes a virar uma refeição. A fantástica história de garoupas e moreias de que vou falar hoje mostra que nunca se devem subestimar as capacidades dos animais, por muito "primitivos" que nos possam parecer. [... ler mais]

A aproximação da garoupa não representa perigo para a moreia. A garoupa passeia-se simplesmente por cima da moreia, mas sem se mostrar agressiva.

Após esta curta visita a garoupa abandona simplesmente o local. Não se trata contudo apenas de uma visita de cortesia destinada a manter relações de boa vizinhança.

A garoupa parte de facto, só que não vai sozinha. Nas sombras movimenta-se uma forma esguia, que se percebe melhor nas imagens tiradas a seguir.

A moreia abandona a protecção da sua toca para seguir a garoupa. O que estará por trás desta estranha amizade? A resposta a essa questão é dada num artigo de Redouan Bshary e colegas na revista PLoS Biology (ref1). Numa tradução livre do resumo:

A caça em grupo intraspecífica tem recebido atenção considerável por causa dos laços íntimos entre o comportamento cooperativo e as suas exigências cognitivas. De igual modo, comparações entre espécies têm focado os comportamento que podem distinguir entre os diferentes níveis de complexidade cognitiva potencialmente envolvidos, tais como comunicação entre parceiros por forma a iniciar uma caçada em conjunto, a adopção de diferentes papéis durante uma caçada comum (quer de forma consistente ou de forma alternada), e o nível de partilha de alimento na sequência de uma caçada com sucesso. Relatamos aqui observações no Mar Vermelho da caçada interspecífica, altamente cordenada e comunicativa, entre a garoupa, Plectropomus pessuliferus, e a moreia gigante, Gymnothorax javanicus. Fornecemos evidência do seguinte: (1) as associações não são ao acaso, (2) as garoupas fazem sinais às moreias para iniciar a busca em conjunto e levam as moreias para locais onde se escondem presas, (3) o assinalar é dependente do nível de fome da garoupa, e (4) ambos os parceiros retiram benefícios da associação.

As garoupas caçam bem em espaços abertos, mas não conseguem seguir presas que se escondam em fendas ou recantos das rochas. As moreias por seu lado não são grande coisa em espaço aberto mas não têm dificuldade em se meter por buracos estreitos. Isso significa que qualquer animal que tenta fugir de uma delas é uma presa potencial para a outra. A caça conjunta faz todo o sentido.

O que torna esta história ainda mais interessante é que a garoupa não se limita a comunicar à moreia que vai iniciar uma caçada. Quando detecta algum animal escondido, à medida dos dotes da moreia, assinala a presença do animal com uma postura específica.

A garoupa persiste neste comportamento durante algum tempo.

O objectivo é chamar a atenção da sua parceira da outra espécie. Quando o consegue pára este tipo de movimentações e fica numa posição de expectativa. A moreia é muito mais esguia e consegue enfiar-se nos buracos e recantos a que a garoupa não tem acesso.

Curiosamente esta associação funciona bem porque não partilham as presas que apanham. Tal como os investigadores indicam no final do resumo:
Os benefícios da caça conjunta parecem ser devidos a hábitos de caça complementares, reflectindo as estratégias evolutivas de cada espécie, mais do que a especialização de papéis durante caçadas em conjunto. Para além disso, a espécie que apanha uma presa engole-a inteira imediatamente, tornando o monopólio agressivo da carcaça impossível. Propomos que o potencial para monopolizar as carcaças por parte de uma das espécies numa parceria representa o constrangimento maior na evolução da caça cooperativa na maioria das combinações de predadores potencialmente mais adequadas.

O que os autores referem aqui é a possibilidade de que num processo de parceria entre espécies, após a captura da presa, um dos animais consiga roubar a presa na maioria das vezes, deixando para o outro apenas os restos. Segundo eles nesse caso as parcerias não evoluem (ou pelo menos não passam de parasitismo). No caso da garoupa e da moreia isso não sucede pois a captura significa engolir imediatamente, não há possibilidade roubo. Ambos os animais ganham com a parceria. Por exemplo, no caso da garoupa solitária, uma presa escondida é uma presa perdida. Tendo a moreia por perto há sempre a possibilidade de que a presa tente fugir da moreia para campo aberto. Com a moreia sucede algo semelhante: uma presa que fuja para campo aberto não está necessariamente perdida desde que haja uma garoupa por perto. Para fugir da garoupa o animal caçado pode voltar a tentar esconder-se.

Para mim o mais notável nesta história é ver os peixes a comunicarem uns com os outros. É algo que não se encaixa na ideia que que fazia dos peixes.

Ficha técnica
Imagens retiradas dos filmes que acompanham o artigo indicado como ref1 abaixo.

Referências
(ref1) Bshary R, Hohner A, Ait-el-Djoudi K, Fricke H (2006). Interspecific Communicative and Coordinated Hunting between Groupers and Giant Moray Eels in the Red Sea. PLoS Biology Vol. 4, No. 12, e431. Laço DOI.

sábado, dezembro 09, 2006

Morrer na selva

Esta imagem de uma fêmea de Gorilla gorilla com a sua pequena cria foi tirada num jardim zoológico. Gorilas semelhantes a este continuam a deambular pelas selvas africanas. Infelizmente talvez não o façam durante muito mais tempo. Acossados pelos seres humanos, as populações já algo reduzidas de gorilas talvez não consigam sobreviver a uma outra ameaça: o Ébola. Eu tinha referido há algum tempo o facto de gorilas e chimpanzés serem afectados pelos surtos de ébola, e que se suspeitava que a doença fosse transmitida por morcegos frugívoros. Na altura não avancei números. Pois bem, os valores acabam de sair, e são devastadores. [... ler mais]

O trabalho de Magdalena Bermejo e colegas é descrito num artigo de apenas uma página na revista Science (ref1) . Numa tradução livre do resumo:

Ao longo do último decénio, a estirpe zairense do vírus do ébola (ZEBOV) tem aparecido repetidamente no Gabão e no Congo. Cada surto entre os seres humanos tem sido acompanhado por relatos de cadáveres de gorilas e chimpanzés nas florestas vizinhas, mas quer a extensão da mortalidade entre os antropóides quer o papel causal do ZEBOV têm sido debatidos de forma acalorada. Apresentamos aqui dados que sugerem que em 2002 e 2003 o ZEBOV matou cerca de 5,000 gorilas na nossa área de estudo. O atraso entre o começo da mortalidade entre grupos vizinhos de gorilas era semelhante ao ciclo da doença do ZEBOV, evidência de que a transmissão grupo-a-grupo amplificou a mortandade entre os gorilas.

Se os números totais são um pouco difíceis de interpretar, os números relativos não deixam dúvidas: 90 a 95% dos animais na área. Os cientistas estavam a estudar, desde 1995, um conjunto de dez grupos sociais, que em 2002 incluiam 143 indivíduos. Pois bem, no seguimento de um surto de ébola nos seres humanos no final de 2001 e início de 2002, foi detectado um cadáver de gorila em Junho de 2002 a poucos km do santuário onde os cientistas efectuavam os estudos. Em Outubro do mesmo ano apareceram os primeiros cadáveres dentro do santuário. De Outubro de 2002 a Janeiro de 2003, desapareceram 130 dos 143 gorilas no grupo de estudo, ou seja 91% dos indivíduos. Algo semelhante sucedeu alguns meses depois. Os cientistas estavam a seguir então sete novos grupos. Um cadáver apareceu em Junho de 2003 a sul do santuário, e cadáveres começaram a surgir no santuário em Setembro do mesmo ano. O ébola espalhou-se de forma progressiva de norte para sul, matando, entre Outubro de 2003 a Janeiro de 2004, 91 dos 95 animais nestes novos grupos, ou seja 95% dos indivíduos. A estimativa dos 5,000 gorilas mortos tem a ver com a contagem dos ninhos de gorilas. Os autores notaram uma redução de 96% nas taxas de ocupação antes e depois dos surtos de ébola. Uma contagem semelhante de ninhos de chimpanzés mostrou uma queda de 83%, embora nesse caso haja uma incerteza maior.

Os autores notaram algo que ajuda a estabelecer o mecanismo de transmissão. O tempo que a doença demorava a passar de um grupo de gorilas a outro (11.2 dias) era quase exactamente igual ao período típico de incubação da doença que anda por volta dos 12 dias. Isto sugere claramente que não se trata simplesmente de uma fonte comum da doença que tenha afectados os diferentes grupos. A doença mostra um padrão que sugere que os animais se infectaram uns aos outros, não apenas dentro de um grupo, mas também de um grupo para outro grupo.

Os autores terminam o curto artigo com uma conclusão nada animadora:
Esperamos que este estudo dissipe quaisquer dúvidas quanto ao facto de que o ZEBOV tenha causado uma mortalidade imensa de gorilas. Os surtos de Lossi mataram tantos gorilas como os que sobrevivem na espécie oriental (Gorilla beringei). Contudo, as perdas em Lossi representam apenas uma pequena fracção dos gorilas ocidentais mortos pelo ZEBOV no último decénio, ou mesmo do número em risco para os próximos cinco anos. Se juntarmos a caça comercial a esta mistura, temos a receita para uma rápida extinção ecológica. Espécies de antropóides que eram abundantes e amplamenta distribuídas um decénio atrás estão a ser reduzidas rapidamente a pequenas populações remanescentes.


Ficha técnica
Imagem da gorila e sua cria retirada da Wikimedia Commons.

Referências
(ref1)Magdalena Bermejo, José Domingo Rodríguez-Teijeiro, Germán Illera, Alex Barroso, Carles Vilà, and Peter D. Walsh (2006). Ebola Outbreak Killed 5000 Gorillas. Science, Vol. 314. no. 5805, p. 1564. Laço DOI.

quarta-feira, dezembro 06, 2006

O Mundo do Hobbit: descendentes de marinheiros?

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Esta imagem mostra o relevo na região do Sudoeste-asiático e Austrália. Os tons de azul escuro são regiões de fundos oceânicos profundos, abaixo dos 3000 metros, as regiões a azul mais claro vão até à superfície, correspondendo os tons ciano quase esverdadeados a regiões que hoje se situam desde o nível do mar a 100 ou 150 metros de profundidade. Os verdes correspondem a regiões de pequena altitude, os amarelos e vermelhos a regiões de altitudes elevadas. A região de baixa profundidade é uma extensão natural dos continentes, e constitui aquilo que se designa por plataforma continental. Notem que eu usei a palavra hoje ao referir-me à região azul-clara. É que durante as eras glaciais o nível do mar encontrava-se mais de 100 metros abaixo do que está hoje, e grande parte dessa zona era terra firme. Isso significa que as ilhas de Samatra, Java, e Bornéu, estavam então directamente ligadas ao continente asiático, e a Nova-Guiné ao continente australiano. Estamos a falar de um período algo recente em termos geológicos: a última glaciação terminou apenas há coisa de 10,000 anos. [... ler mais]

Para ilustrar melhor os aspectos relativos à Ilha das Flores eis abaixo uma ampliação de parte do mapa.

Como podemos ver as Celebes e um conjunto de ilhas a este de Java não ficam directamente ligadas aos continentes mesmo durante os períodos de mar mais baixo durante as glaciações. Este conjunto de ilhas é conhecido colectivamente pela designação de Wallacea. O nome vem do naturalista Alfred Russel Wallace, que notou uma diferença entre as faunas deste conjunto de ilhas relativamente às faunas de ilhas como Java, Bornéu, Samatra e Bali. Enquanto as ilhas como Java partilham essencialmente a fauna asiática, com rinocerontes, felinos e antropóides, as ilhas da Wallacea possuem um grande número de espécies endémicas. As Flores são parte desta Wallacea:

Mesmo durante as épocas glaciares existiriam sempre extensões mais ou menos longas de mar que a fauna teria que atravessar, em particular uma que separa Bali da ilha a este (Lombok), com um fosso de 25 km de largura, e outra entre as Flores e a ilha a oeste (Sumbawa) com 9 km de separação mínima. Apenas animais terrestres com boa capacidade como nadadores, como os elefantes, ou capazes de viajarem em jangadas, como pequenos reptéis e roedores, conseguiriam atingir a Ilha das Flores. Não foram assim tantas espécies a fazerem a travessia, e a frequência das travessias deve ter sido suficientemente baixa para permitir aos animais da ilha evoluirem para formas distintas quer das espécies do continente, quer das ilhas à volta.

Esta presença de grandes extensões de mar aberto, que seria preciso atravessar para ir da Ásia até às Flores, tornam a presença dos hobbits na ilha ainda mais notável. É pouco provável que tenham atravessado toda a região por acaso durante alguma catástrofe natural, pois mais nenhum animal de porte intermédio, excepto os elefantídeos estogodontes, o fizeram durante todo esse tempo. Tudo aponta para que os antepassados destes seres tenham construído algum tipo de jangadas. Se bem que esse tipo de sofisticação não seja de esperar em criaturas com um cérebro não maior que o de um chimpanzé, não seria de todo inesperado se os primeiros ocupantes da ilha fossem Homo erectus típicos, cuja estatura e capacidade craniana só tenham diminuído no curso das gerações subsequentes a se terem estabelecido na ilha. Há no entanto uma outra indicação de que o Homo floresiensis seria bastante mais capaz do ponto de vista cognitivo do que o tamanho do seu cérebro deixaria antever: utensílios de pedra. Falarei disso na próxima contribuição.

Ficha técnica
Mapas de relevo feitos usando informação da base de dados ETOPOv2 da NOAA.

O Mundo do Hobbit: humanos minúsculos, ratos gigantes

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O garboso caçador das Flores, que mostrei na contribuição anterior sobre este tema, levava ao ombro um animal de razoável tamanho, que apesar das orelhas curtas se reconhecia bem como algo da família dos ratos e ratazanas. Um animal semelhante, que partilhou a ilha com o hobbit, e que provavelmente seria uma das iguarias apreciadas pelo pequeno povo da ilha, existe ainda hoje em dia. Pode parecer estranho mas a ilha que produziu os mais pequenos entre os humanos é o lar de ratazanas enormes. As duas criatura da imagem são ratazana-gigantes das Flores, de seu nome científico Papagomys armandvillei. O gigante no nome é relativo aos outros membros da família: é que para ratazana ter 45 centímetros de comprimento do corpo e cabeça não é nada mau. O tamanho da P. armandvillei corresponde a cerca do dobro da ratazana comum, Rattus norvegicus. Trata-se de um animal endémico das Flores, isto é, que não existe naturalmente em mais nenhum lugar do mundo. [... ler mais]

Encontrei algumas referências à fauna presente e extinta da ilha num excelente artigo de Guy Musser no Bulletin of the American Museum of Natural History (ref1). É um bocado detalhado demais para citar aqui como costumo fazer, mas para aqueles que gostam de ver crânios e dentes de ratos recomendo-o vivamente, Tem tudo o que sempre quiseram saber sobre as ratazanas das Flores. Guy Musser refere lá que das 32 espécies de mamíferos não humanos das Flores, incluindo fósseis e subfósseis, 13 são habitantes "recentes", muito provavelmente trazidos pelos agricultores humanos que se estabeleceram na ilha nos últimos 5,000 anos. Uma grande fatia das espécies de mamíferos que habitam, ou habitaram algures no passado as Flores, são ratos ou ratazanas, num total de 12 espécies. Cinco dessas espécies são endémicas e uma sexta practicamente também o é, conhece-se também das ilhas de Komodo. Dessas seis espécies endémicas ou quase, cinco são representadas apenas por fragmentos fósseis e subfósseis. Resta apenas a P. armandvillei.

Para compreender a relativa raridade de espécies de mamíferos nas Flores, e o número razoável de espécies endémicas, é preciso tecer algumas considerações sobre a geografia da região. Falarei disso na próxima contribuição.

Ficha técnica
(ref1) Musser, G.G (1981). The Giant Rat of Flores and its Relatives East of Borneo and Bali. Bulletin of the American Museum of Natural History 169:67-176.

terça-feira, dezembro 05, 2006

Navegar num mar de pedra

Fredrik Fransson tinha este sonho de agarrar num barco e atravessar o Pacífico. Tanto sonhou que um dia lá se decidiu, despediu-se do emprego, convenceu o tio Hakan e uma amiga chamada Jenny a irem com ele como tripulação, e pronto, lá partiram de São Francisco em direcção à Austrália. A viagem já terminou. Pelo caminho, para lá das vicissitudes normais nestas coisas, viram nascer uma ilha e navegaram num mar de pedra. Mas nada melhor do que as palavras dos que viveram a experiência. [... ler mais]

Talvez já tenham ouvido falar daquela superstição entre marinheiros que diz que "nunca se deve partir numa sexta feira". Pois bem, nós partimos e o mar transformou-se em pedra.

Este texto algo lacónico foi retirado do blog que Fredrik Fransson manteve durante a viagem, o Fredrik and Crew on Maiken, A fotografia vem daí. Escolhi esta porque aparece um pouco por toda a parte na internet, mas há muitas mais nesta página do blog, incluindo algumas da nova ilha vulcânica. Como certamente adivinharam esta é a jangada de pedra-pomes ao largo de Tonga de que falei ontem.

segunda-feira, dezembro 04, 2006

A jangada de pedra

Esta é uma imagem tirada em Setembro de 2005 pelo instrumento Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer (MODIS) a bordo de um satélite da NASA chamado Aqua. A imagem mostra um conjunto de ilhas no Oceano Pacífico, mais especificamente o arquipélago de Tonga. Trata-se uma paisagem bonita, mas o que me levou a mostrá-la foi um fenómeno que sucedeu cerca de um ano depois, em Agosto de 2006. Nessa data o arquipélago ganhou mais uma ilha. Uma nova ilha vulcânica a nascer das profundezas é sempre algo interessante, mas neste caso foi acompanhada de um fenómeno curioso, algo de que eu já tinha ouvido falar mas que nunca tinha visto em imagens. [...ler mais]

Comecemos por ampliar a região do pequeno quadrado junto ao canto superior direito da imagem.

Comparem agora essa imagem com uma imagem tirada em 2006, no dia 10 de Agosto. Há duas coisas novas na imagem mais recente.

Uma delas é a ilha vulcânica, ligeiramente abaixo e à esquerda da ilha de Late. Acima da ilha de Late há uma massa acastanhada que flutua sobre as águas do Pacífico. Do que se trata? Pois bem, nada mais nada menos do que rocha vulcânica. Calhaus que flutuam, e que retiram significado à expressão "afundar-se como uma pedra". Nem todas as pedras se afundam, algumas pelos vistos nadam muito melhor do que eu. Só agora descobri as imagens e tinha que partilhá-las. Trata-se de um fenómeno que já tinha sido descrito mas que ganha outro tipo de espectacularidade quando se vêm imagens como estas. Gosto particularmente da língua de rocha flutuante que liga o grosso da jangada à ilha de Late. Esta jangada de pedra-pomes foi mesmo notícia nos noticiários de Tonga porque entupiu o sistema de refrigeração de um iate que inadvertidamente cruzou aquelas águas e teve que voltar para trás.

Ficha técnica
Imagens e inspiração para o texto obtidas a partir desta página do NASA Earth Observatory.