quarta-feira, janeiro 24, 2007

As mensagens póstumas das vespas

Publicámos, recentemente, um artigo indicando que vespas em agregados depositam feromonas peptídicas, nos hibernáculos onde passam o inverno, que são sentidas pelas raínhas das gerações posteriores quando buscam locais adequados para hibernarem. O facto intrigante é este: as vespas da geração seguinte recebem uma informação depositada por vespas que morreram uns meses atrás, pelo que estes peptídeos actuam como "palavras num livro" deixado por escritores antigos!
Publicámos, recentemente, um artigo indicando que vespas em agregados depositam feromonas peptídicas, nos hibernáculos onde passam o inverno, que são sentidas pelas raínhas das gerações posteriores quando buscam locais adequados para hibernarem. O facto intrigante é este: as vespas da geração seguinte recebem uma informação depositada por vespas que morreram uns meses atrás, pelo que estes peptídeos actuam como "palavras num livro" deixado por escritores antigos!

Esta é a tradução de uma mensagem que Leonardo Dapporto deixou na caixa de comentários da minha contribuição sobre as vespas brincalhonas. Este comentário ilustra bem uma das vantagens de um blogue com caixa de comentários aberta: a referência a outros estudos interessantes, ainda por cima por parte de um autor do estudo que eu estava a descrever. Mais uma vez as heroínas da história são as vespas da espécie Polistes dominulus. Este novo estudo fala da comunicação química nas vespas. A comunicação química, utilizando feromonas, é algo muito espalhado nas espécies de insectos, só que estas vespas vão mais além, e usam um tipo especial de feromonas para comunicarem mesmo depois de mortas. [... ler mais]

O artigo da autoria de S. Turillazzi e colegas foi publicado na revista Current Biology (ref1). Numa tradução livre de parte do início do artigo:
No final do verão, as raínhas acabadas de emergir e de acasalar abandonam as suas colónias e formam enxames de centenas de indivíduos em locais abrigados, conhecidos como hibernáculos, onde passam a estação fria. A hibernação é um período crítico e a selecção de um abrigo de inverno é provavelmente essencial para a sobrevivência. As vespas muitas vezes invernam no mesmo abrigo ano após ano, o que sugere a presença de pistas persistentes que marcam os hibernáculos utilizados. Este aspecto foi apontado pela primeira vez por Rau em 1930, que também observou fêmeas Polistes annularis a inspecionaram possíveis hibernáculos. Relatamos aqui que, para futuras raínhas de Polistes dominulus, estas pistas persistentes são peptídeos, encontrados na sua cutícula e no seu veneno, que actuam com feromonas marcadoras de hibernáculos de uma geração a outra.

Os peptídeos são pequenas cadeias de aminoácidos, os constituintes das proteínas. A experiência que os autores executaram é bastante simples do ponto de vista conceptual. Cada vespa solitária em período de hibernação era colocada num dispositivo em que podia escolher um entre dois tubos como local onde continuar a hibernar. Quando a escolha era entre um tubo não utilizado, ou um tubo utilizado anteriormente por outras vespas, as vespas preferiam tubos previamente ocupados por outras vespas, mesmo que abandonados há mais de oito meses. Os autores verificaram que a pista que as vespas seguiam era a presença de peptídeos existentes no exosqueleto e no veneno das vespas, a que chamaram dominulinas em honra à espécie de vespas. Estas dominulinas só persistem durante longos períodos de tempo em locais à prova de água, e são assim um bom indicador de um abrigo bem protegido.

Há frases que de tão inusitadas por se referirem a insectos me ficam na memória. Depois das "simultaneamente profecias e histórias" aquando da dança das abelhas, eis agora o "palavras num livro deixado por escritores antigos" relativas às mensagens que as vespas deixam para serem lidas depois de mortas.

Ficha técnica
Imagem de vespa cortesia de Ellen Levy Finch, retirada desta página da Wikimedia Commons.

Referências
(ref1) Turillazzi S., Dapporto L., Pansolli C., Boulay R., Dani F.R., Moneti G., Pieraccini G. (2006). Habitually used hibernation sites of paper wasps are marked with venom and cuticular peptides. Current Biology Volume 16, Issue 14, Pages R530-R531. Laço DOI.

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