segunda-feira, agosto 27, 2007

Em Nilgiris em busca de chá (VIII)

No dia a seguir ao meu regresso de Madurai o tempo melhorou um pouco mas os macacos não voltaram. Contudo no dia seguinte a manhã mostrava-se amena, quase quente mesmo. As nuvens cobriam o céu mas eram brancas, e aqui e ali viam-se uns laivos de azul. Meti-me por isso a caminho, tentando descobrir por onde deambulavam os macacos quando não estavam entretidos a comer a vegetação na vizinhança do meu alojamento. Meti-me por isso à estrada. [... ler mais]

Nalguns pontos do caminho era por demais evidente a fragilidade do habitat dos langures de Nilgiris. A presença humana estava logo ali ao lado, sob a forma de verdejantes plantações de chá.

Percorri uma vasta extensão em torno do meu alojamento sem ver os macacos, mas não desanimei. Vi no entanto alguns animais, sobretudo corvos, algumas lebres, alguns parentes selvagens das galinhas domésticas, e vários pássaros pequenos. Tirando os corvos, todos os outros animais se mostraram demasiado esquivos para os meus limitados dotes de fotógrafo. O facto de não ter encontrado os langures não queria dizer grande coisa. Da outra vez tinha conseguido avistá-los apenas ao fim da tarde. Assim, a seguir ao almoço voltei a seguir os mesmos caminhos.

O dia continuava prazenteiro, e eu deslocava-me mesmo em manga curta. Ora enquanto tirava a fotografia a este ajuntamento de árvores ouvi o característico barulho dos saltos dos langures de ramo para ramo. Quando me virei na direcção do som vi então um macaco não muito distante de mim, empoleirado numa árvore de tronco fino, entre dois eucaliptos de troncos grossos. O animal não se mostrava interessado na minha presença, pelo que após uma fotografia tirada à socapa me afastei do local.


Agora que já sabia de onde eles vinham podia escolher locais adequados para os observar. Selecionei por isso regiões abrigadas, mas não escondidas, entre este ponto e o local onde os tinha visto no outro dia. Os animais poderiam ver-me, evitando surpresas que os pudessem assustar, mas a distância deveria ser suficiente para que não me considerassem uma ameaça. Na vez anterior tinha reparado num habitante das redondezas a trabalhar não muito distante do local onde os langures se alimentavam, pelo que escolhi uma distância dessa ordem de grandeza. Pode parecer excesso de zelo da minha parte mas sinto que é preferível perder uma fotografia a perturbar os animais. Comportamentos "à turista" de perseguir e incomodar os animais são de evitar a todo o custo.

Claro que quando há trabalho científico em jogo, importante para a preservação da espécie em questão, as coisas são diferentes, mas neste caso não havia qualquer tipo de urgência científica. Esperei assim tranquilamente pelos langures. Na verdade até tive tempo de ir tomar chá. Eles acabaram por aparecer, com o barulho típico dos seus saltos de árvore em árvore. O primeiro a chegar pode ser visto nesta imagem, lá longe, sentado sobre um ramo uns metros acima da estrada. Ora onde se vê um macaco podem aparecer outros, e neste caso não foi preciso esperar muito.

Uns minutos depois consegui detectar um segundo animal, uns metros acima, como se mostra nas imagens, onde os quadrados à direita são ampliações da imagem do outro lado.

O animal mais abaixo de vez em quando olhava para mim, pelo que lentamente me afastei um pouco mais. Uns minutos depois acabou por me ignorar completamente e virou a sua atenção para as folhas e rebentos de que se alimentava. Não demorou muito para que tivesse macacos a passearem literalmente sobre a minha cabeça, tal como estes dois, que não ficaram famosos na fotografia pois o tom negro da sua pelagem não combina bem com o brilho das nuvens.

Na verdade devia dizer três. O animal da esquerda carrega uma cria, com pelagem escura e difícil de ver contra a silhueta da mãe, sobretudo numa fotografia tão pobre. Deve tratar-se de um dos bebés de Maio característicos da espécie, que apresenta ainda um outro pico de natalidade em Novembro. Os pequenitos nascem com uma cor castanho-avermelhada e é por volta dos três meses que adquirem a coloração negra. Pude verificar que o grupo era maior do que eu supunha, com cerca de uma dezena de indivíduos, constituído sobretudo por fêmeas adultas. A forma mais fácil de determinar o sexo destes animais é através de uma região de pêlos brancos na face interior da coxa que só as fêmeas apresentam.

Os langures "atravessavam a estrada" saltando sobre as árvores. Só os vi no solo na vizinhança do meu quarto, onde se alimentavam de vegetação rasteira, mas não consegui boas fotos pois eles pulavam para o lado das árvores oposto a mim, levando alguma matéria vegetal na boca. Pouco depois os macacos partiram, enquanto o Sol desaparecia sob um dos picos das redondezas. Não foi mau para último dia. No dia seguinte iniciava o demorado regresso a Vila Nova de Gaia.

Abandonei as Nilgiris com mais uma paragem para tomar um chá de beira de estrada em Kotagiri. Mas não se tratou de um adeus, apenas de um até breve, devo voltar em Dezembro, altura da estação seca. Vou trazer equipamento mais adequado, e espero conseguir então algumas fotos de langures bebés castanhos e confirmar algo de supreendente que vi nesta população.

Ficha técnica
Imagens da minha autoria. Podem ser utilizadas livremente.


domingo, agosto 26, 2007

Em Nilgiris em busca de chá (VII)


Tendo finalmente encontrado os macacos negros fui para a cama satisfeito, e adormeci rapidamente, embalado por sonhos agradáveis. Contudo, o meu sono foi em breve interrompido pela desconfortável sensação de frio, e pelo barulho da chuva e do vento. Pelos vistos uma nova depressão teria encontrado o caminho do Golfo de Bengala. Resmungando contra os elementos, fui buscar mais um cobertor (com este eram três) e voltei a adormecer. Se adormeci mal-humorado, foi ainda rezingão que acordei umas horas mais tarde, e ao olhar o céu da manhã assim me mantive. Nuvens, e mais nuvens, e talvez o frio mais intenso que eu tinha experimentado nesta minha estadia nas Nilgiris. Macacos nem vê-los. [... ler mais]

O mau tempo durou mais alguns dias, período em que os macacos não se dignaram aproximar do meu quarto. Aproveitei por isso para ir a Madurai visitar o fabuloso templo local. Madurai é uma cidade interessante, que nunca dorme. É mesmo verdade. Por exemplo, se vos apetecer chá ou comida a qualquer hora da madrugada há imensos lugares abertos, todos com um número razoável de clientes. Por outro lado, se lá forem preparem-se para a aventura que é atravessar a estrada. Os veículos ignoram a existência dessas coisas chamadas peões. Felizmente que ia com alguns habitantes locais que, várias vezes, me puxaram in-extremis antes de ser passado a ferro por um autocarro, ou abalroado por um auto.

Mas Madurai é sobretudo o templo de Meenakshi, com as suas imponentes 4 torres principais, alinhadas com os pontos cardeais. Eis uma visão do interior, onde se distingue uma das torres e o famoso Lótus dourado, num tanque de antiga reputação, mas onde hoje em dia apenas os mais devotos se lavam.

Estas torres são ricas em detalhes que contam histórias, relatos dos feitos dos deuses. Entre as vária fotografias que tirei estava esta, e só mais tarde me apercebi do que se tratava.

Trata-se de uma cena que eu conhecia do Ramayana de Valmiki. Eis aqui algo que com boa vontade se pode chamar uma tradução (feita por mim) da passagem relevante a partir da versão inglesa de R.T. Grifith:

Fortes eram os filhos nascidos de Diti;
E as valorosas crianças de Aditi também
eram bastante poderosas, boas e sinceras.
Os irmãos rivais intrépidos e corajosos
De mães-irmãs nascidos, competiram
Linhagem contra linhagem, com inveja e ciúme.

Para os menos versados no hinduísmo, Diti e Aditi eram as mães, respectivamente, dos Asuras e dos Devas, seres de carácter divino. O correspondente na mitologia grega seria equiparar os Devas aos Deuses e os Asuras aos Titãs. No detalhe do templo que eu mostrei acima, os Devas estão à esquerda, os Asuras (com grandes dentes que saem da boca) à direita. Embora filhos do mesmo pai, logo irmãos, os Devas e Asuras tinham uma relação de conflito mais ou menos aberto, mas por uma vez decidiram unir esforços:
Quando os bandos se encontraram
E, reunidos num concílio odioso, planearam
Viver, não molestados pela idade e pelo tempo,
Imortalizados na força da sua juventude.
Este era então, após discussão devida,
O conselho dos sábios e eminentes,
Agitar com potência o mar leitoso
Para a bebida dadora de vida libertar.

Esse líquido da vida, era o Amrita, e a forma de o libertar do mar leitoso algo sui-generis:
Tendo isto planeado, capturaram o Rei das Serpentes,
Vasuki, para servir de correia,
E a montanha Mandar para o seu eixo,
E agitaram com todo o seu ímpeto.
Dessa forma, ao longo de um milhar de estações,
Desta forma e daquela outra pela serpente puxaram,

Os Asuras ficaram a agarrar no lado das cabeças da serpente, enquanto os Devas no lado da cauda. Cada um dos grupos puxava à vez pelo rei das serpentes, o que fazia girar a montanha num sentido e depois noutro. A montanha ameçou desprender-se e foi o Deus Visnú que a suportou sob a forma de uma tartaruga (visível na imagem que mostro acima). Infelizmente quando tirei a fotografia não reparei que era esta a história retratada. Tenho várias fotografias desta parte do templo, infelizmente as várias cabeças de Vasuki estão encobertas pela árvore em todas elas.

Os versos continuam mais vou poupar-vos a uma maior exposição aos meus fracos dotes como tradutor. Do agitar das águas muitas coisas resultaram, incluindo, ao fim de mil anos, o tal Amrita. Aí quebrou-se a aliança. Os Devas, pela força e pelo ardil, levaram a melhor sobre os Asuras que foram banidos para as profundezas. Esta é apenas uma das muitas histórias retratadas nas paredes do templo.

Resumindo, pois podia encher páginas e mais páginas só com o que vi em Madurai, o templo é um local fabuloso, com o seu salão das mil colunas, e as ilustrações do casamento de Meenakshi. Vale bem uma visita, mesmo que certas zonas não sejam acessíveis aos não hindus. É que não convém esquecer que é um templo, não um museu, isto é, é dedicado aos crentes, não aos simples turistas. Um aviso no entanto. Madurai é muito quente, e no templo temos que andar descalços, num chão de pedra, que nas partes expostas ao Sol aquece de tal forma que poderia servir para grelhar bifes. Eu fartei-me de correr de sombra para sombra, para gáudio dos meus acompanhantes indianos. Não posso deixar de referir que não vi um único macaco em Madurai, exceptuando este baixo-relevo numa das colunas do templo. Talvez ilustre uma história mas nenhum dos meus guias me soube elucidar.

Claro que não deixei Madurai sem experimentar a cozinha local, famosa entre outras coisas pelos vários tipos de dosai. A imagem abaixo ilustra a minha refeição depois de terminar a visita ao tempo (com uma pequena paragem para pôr os meus pobres pés de molho).

Eu fui sóbrio e escolhi uma simples kaalan dosai, mas os meus acompanhantes indianos não resistiram ao apelo do ezhu suvai uttapam. Dosai assemelha-se a uma espécie de crepe, uttapam faz pensar (pelo aspecto apenas) em panquecas, kaalan é tamil para cogumelo, e ezhu suvai quer dizer sete sabores.

Depois de terminar a refeição (e o chá que se seguiu) fiquei a saber que o tempo nas montanhas deveria melhorar nos dias seguintes. Com um pouco de sorte talvez ainda conseguisse voltar a ver os langures nos dois dias que me restavam nessa minha estadia no sul da Índia.

Ficha técnica
Todas as fotografias são da minha autoria. Podem ser utilizadas livremente.

sábado, agosto 25, 2007

Em Nilgiris em busca de chá (VI)

Este rosto escuro rodeado de uma cabeleira loira era o que eu tanto procurava. Ironicamente, depois de deambular horas pela selva, dou com os macacos negros perto de "casa", a poucos passos do local onde tinha dormido nos últimos dias. Estas criaturas, conhecidas como langur das Nilgiris, de seu nome científico Semnopithecus johnii, são classificadas como vulneráveis à extinção, já não restam muitos e o futuro da espécie é incerto. Mas este macaco não se interessava muito por essas coisas. Naquele momento estava apenas espantado com a estranha criatura que lhe perturbava o repasto, e reagiu subindo à árvore mais próxima. Aí ficou claro o porquê da designação de macaco preto. [... ler mais]



Eis aqui um detalhe da imagem do espantado langur, ainda a olhar para mim. Trata-se de um macaco relativamente pequeno, com cerca de 70 centímetros de comprimento de corpo. Notem bem o gigantesco tamanho da cauda, cujo comprimento é comparável ao do corpo. Os langures negros são animais muito ágeis, que se movem rapidamente entre ramos, e que saltam sem medo de árvore para árvore. São criaturas magníficas e era uma sensação fantástica estar tão perto delas.

Eu entretanto tinha-me afastado, para não perturbar os animais, que mereciam comer em paz. Os langures, pois como rapidamente descobri, tratava-se de um grupo de pelo menos seis animais, acabaram por quase me ignorar ao fim de algum tempo. O animal que eu tinha assustado chegou mesmo a virar-me tranquilamente as costas.

Os outros membros do grupo estavam algo distantes, mantinham-se atarefados na copa das árvores vizinhas. Eis aqui algumas imagens de um dos outros elementos do grupo.

Depois destas fotografias rápidas afastei-me, deixando os animais comerem em paz.

Ficha Técnica
Fotos da minha autoria. Podem ser utilizadas livremente.

Em Nilgiris em busca de chá (V)

Finalmente, após vários dias decepcionantes, acordei com bom tempo em Udhagamandalam. O Sol brilhava, os pássaros cantavam e foi com boa disposição (e menos frio que nos dias anteriores) que saboreei o meu pequeno almoço, pongal, seguido do costumeiro chá. Após conferenciar com alguns habitantes locais sobre os melhores locais onde procurar parti em busca do raro e ameaçado karungurangu, que é como se diz macaco negro em tamil. [...ler mais]

Como referi numa das contribuições anteriores, grande parte das Nilgiris foi transformada pela actividade humana. Para lá dos campos de chá, há ainda grandes plantações de legumes e eucaliptais. Restam no entanto algumas regiões de floresta, que são áreas protegidas, onde a entrada de visitantes é controlada. Eu tinha acesso a essas áreas, mas com com algumas condições: não me afastar demasiado da estrada ou caminhos, e não perturbar os animais que porventura encontrasse. Segui assim primeiro ao longo da estrada que mostro na imagem acima, onde os habitantes locais me disseram ser possível ver karungurangu a alimentarem-se durante períodos de bom tempo. Percorri lentamente esta estrada, andando umas dezenas de metros e depois parando para escutar e prescrutar as árvores circundantes. Não tendo tido sucesso, meti-me por alguns caminhos usados pelos habitantes locais. Experimentei mesmo alguns carreiros, embora tenha tido sempre cuidado para não me embrenhar demasiado pela selva adentro. É que ouvi histórias sobre a presença de leopardos na região. Após algumas horas de busca infrutífera decidi voltar à proveniência em busca de almoço e chá.

Durante a tarde lá voltei aos caminhos, tal como este,
e ainda este, onde deambulei por algumas horas, sem sucesso.

Voltei assim um pouco desanimado ao local onde tinha o meu quarto, sem ter conseguido ver os esquivos macacos pretos. Eis senão, quando a poucos metros do local onde dormia, dou de caras com um rosto no meio da vegetação:

Pois é, enquanto eu os procurava pela selva adentro, os karungurangu devoravam a vegetação em torno do meu quarto.

A contribuição já vai longa pelo que para já fico por aqui. Mais fotos de macacos na próxima contribuição.

Ficha técnica
Fotos da minha autoria. Podem ser utilizadas livremente.

sexta-feira, agosto 24, 2007

Em Nilgiris em busca de chá (IV)

Como descrevi na contribuição anterior, devido ao mau tempo resolvi esquecer os macacos e parti para Mudumalai para tentar ver pelo menos um yanai selvagem. Na verdade consegui ver um macho solitário, muito ao longe. Contudo, não me arrisquei a procurar um local adequado para tirar uma foto: é que estes animais investem quando incomodados. Ora se os yanai se mostravam ariscos, em compensação os veados sarapintados comportavam-se como se eu não estivesse lá. O imponente macho da imagem ao lado fazia parte de um pequeno grupo que chegou mesmo ao cúmulo de atravessar a estrada à minha frente, devagar-devagarinho e ignorando completamente as viaturas. [... ler mais]



Como ficava mal uma excursão em busca de yanai sem fotografar nenhum desloquei-me a um local onde se encontravam versões domesticadas das criaturas. A razão pela qual não me pude embrenhar pela selva adentro é porque para o fazer necessitamos de apanhar boleia no dorso de um elefante indiano, de seu nome científico Elephas maximus.

Como já devem ter adivinhado yanai não é mais que a palavra em tamil para designar elefante. Para seguir os bravios convém viajar no dorso de um manso. A foto acima foi tirada num local onde os visitantes do parque podem apreciar o alimentar dos elefantes a meio da tarde. Os tratadores fornecem várias bolas de alimento, à base de arroz e vegetais aos pacatos paquidermes.

Como podem verificar, os elefantes limitam-se a abrir a boca, o tratador mete lá dentro a papinha toda. Notem bem o ar de felicidade do Vijai, com a tromba levantada e a boca bem aberta.

Mas o festim não se limita aos elefantes, outras criaturas vêm em busca de sobras. Entre elas os nossos já conhecidos javalis indianos.

Até os pavões selvagens se passeiam pelas redondezas. Depois de tantas tentativas falhadas ao longo da estrada, consigo uma foto de um pavão macho, junto a um recinto de elefantes, no meio de uma multidão de turistas!

Nesta série de contribuições sobre as Nilgiris, eu falei já por diversas vezes em macacos e convém esclarecer algo. Em Mudumalai, e mesmo em grande parte das regiões de menor altitude das montanhas de Nilgiris, encontra-se facilmente um kurangu em qualquer berma de estrada. Esta é designação em tamil para os macacos mais comuns no território. Como tinha acontecido durante a minha viagem inicial, montes acima, vi imensos destes curiosos macacos cinzentos, habituados (por vezes mesmo demais) à presença humana.

Só bem que interessantes, estes animais da espécie Macaca radiata, não eram os macacos que eu tanto queria ver nas Nilgiris. Felizmente, a depressão no Golfo de Bengala tinha-se deslocado e a previsão meteorológica para o dia seguinte afigurava-se propícia. Na próxima contribuição: finalmente vejo o meu primeiro karungurangu.

Ficha técnica
Fotografias da minha autoria, podem ser utilizadas livremente.

Em Nilgiris em busca de chá (III)

O ponto mais alto do Sul da Índia fica no pico da montanha chamada Doddabetta, não muito longe de Udhagamandalam. O que eu mostro aqui na imagem é uma tabuleta de um famoso miradouro no Doddabetta que permite olhar para o parque nacional de Mukurthi. É suposto ser uma paisagem bonita. Digo suposto porque a bruma e as nuvens tapavam tudo. Não tentei sequer esperar por uma aberta pois entretanto veio a chuva e o frio acentuou-se. Durante os primeiros três dias que passei nas Nilgiris o tempo não melhorou. Pelo contrário, o vento, o frio, e a chuva, acentuaram-se. [... ler mais]

Este mau tempo significava que as minhas excursões em busca de macacos teriam que esperar. Sem indicações de melhorias do tempo para breve, resolvi por isso, no dia seguinte, desviar a minha atenção para o temível yanai selvagem. Em companhia de alguns habitantes locais desci por isso as montanhas até chegar ao santuário de vida animal de Mudumalai. Infelizmente, mesmo em Mudumalai, o tempo não era famoso, e a incursão planeada pela selva adentro não podia ser realizada, teríamos que nos restringir às bermas das estradas. Um dos meus companheiros de viagem sugeriu, no entanto, uma ida a uma pequena cachoeira onde por vezes um ou outro yanai iam beber.

Encontrei de facto vestígios de yanai, mais exactamente dos seus excrementos, ligeiramente abaixo da cachoeira.

Infelizmente, a chegada de inúmeros turistas levou-nos a seguir caminho. Nenhum yanai que se preze se iria deslocar a um sitío tão movimentado.

O extraordinário em Mudumalai é a quantidade de animais selvagens que se podem ver na berma da estrada. Eis aqui uma foto de maan, tamil para os veados sarapintados de seu nome científico Axis axis, a pastarem tranquilamente a poucos metros da minha viatura.

Pouco depois encontrei este fulano, um kattupanni, que em tamil significa porco bravo. Trata-se de um javali indiano de nome científico Sus scrofa cristatus.

Por toda a parte se encontravam mayil, que é como se diz pavão em tamil, ou seja a fabulosa ave da espécie Pavo cristatus. Infelizmente os machos pareciam andar a gozar comigo. Ficavam lá parados, em belas poses, mas assim que eu levantava a câmera escondiam-se. Após muito penar o melhor que arranjei foi esta foto de uma pavoa.

Nesta altura parámos para tomar chá, de Nilgiris claro, pausa que aproveito para interromper a contribuição. Continua amanhã.

Ficha técnica
Todas as fotos foram tiradas por mim. Podem ser utilizadas livremente.

quinta-feira, agosto 23, 2007

Em Nilgiris em busca de chá (II)

Como referi na contribuição anterior o meu destino eram as Nilgiris, as montanhas azuis. A que se assemelham as Nilgiris? Bem, acima de mil metros são sobretudo verdejantes campos de chá. É que o distrito de Nilgiris é famoso pelo seu chá, saboroso e de aroma forte. Esta panorâmica mostra o Lago Esmeralda, próximo da localidade com o mesmo nome. Como podemos ver a paisagem foi fortemente modificada pelos seres humanos. Chá, chá e mais chá, por toda a parte. Existem, no entanto, algumas zonas de vegetação densa, protegidas e de acesso limitado, onde sobrevivem a fauna e flora originais das montanhas. [... ler mais]

As Nilgiris são famosas pelas suas casas de chá de beira de estrada, como a que se mostra aqui, em Kotagiri.

Não se deixem impressionar pelo aspecto do estabelecimento, aqui o chá era mesmo muito bom. Passei grande parte do meu tempo a saborear chá com leite em casas de chá deste tipo, e o chá nunca me desiludiu.

Após uma pausa e um chá revigorante, pus-me novamente a caminho e cheguei finalmente a Udhagamandalam, a capital das Nilgiris. Tal como muitas municipalidades indianas mudou recentemente de nome. Antes era conhecida por Ootacamund, abreviada muitas vezes para Ooty. As montanhas azuis possuem um clima de tipo europeu, e os britânicos estabeleceram-se de armas e bagagens no local, durante o raj. A influência é ainda visível: este cruzamento, o ponto de encontro por excelência em Udhagamandalam, é chamado de Charing Cross.

Udhagamandalam está acima de 2,200 metros de altitude e durante a noite pode ser muito fria, mesmo durante os meses de verão. Para piorar as coisas, um depressão no Golfo de Bengala trazia vento e chuva persistentes. Depois de ter vestido uma malha e um casaco e, mesmo assim, continuar com frio, resolvi testar a cozinha local, num estabelecimento cujo aspecto fazia em tudo lembrar as casas de chá de Kotagiri. Como estava fatigado pedi algo simples, chappathy com vegetais.

Com o estômago aconchegado, mas cansado e cheio de frio, procurei o meu alojamento, numa zona de natureza protegida, um pouco para lá da cidade. Após um banho quente e com dois cobertores em cima de mim, adormeci e sonhei com macacos. É que o objectivo da minha viagem não era na verdade visitar as casas de chá de Nilgiris, o que eu buscava eram os karungurangu.

Ficha técnica
Fotos da minha autoria, podem ser utilizadas livremente.

quarta-feira, agosto 22, 2007

Em Nilgiris em busca de chá (I)

O interregno afinal prolongou-se mais do que esperava pois entretanto voltei à Ásia. O meu périplo asiático terminou no sul da Índia, no estado de Tamil-Nadu, numa viagem que teve que ver com chá e com macacos. Após uma aterragem na capital Chennai, apanhei um outro vôo, para Coimbatore. Foi aí que saí, mais as minhas bagagens, que incluíam roupa quente, casacos e guarda-chuva, pronto para me fazer à estrada, pois tinha ainda que percorrer umas dezenas de quilómetros antes de chegar ao meu destino. Roupa quente não é engano. Embora localizado no sul da Índia, o local que eu buscava caracteriza-se por frio e chuva. [... ler mais]



Mas antes de me aventurar pela estrada resolvi procurar um pouco de alimento. Para almoço escolhi algo leve, pois esperavam-me horas de uma viagem por estradas cheias de curvas. Comi por isso um pouco de sambar, acompanhado de urulaikizhangu, kichadi, appalan e murungaikai.




Tudo consumido de acordo com as normas locais: com a mão (direita) e em cima de uma folha de bananeira. Quanto aos nomes misteriosos da comida, sambar é tamil para arroz, e urulaikizhangu quer dizer batatabatata (literalmente). Os restantes são nomes locais de pratos de vegetais. Para terminar este repasto bastante condimentado pedi tea com paal, que é como quem diz chá com leite. O chá em Coimbatore é trazido dentro de um copo metálico, acompanhado de uma pequena malga, e vem a ferver. Infelizmente só depois de ter escaldado os dedos é que percebi a razão dos dois recipientes.


Ao iniciar a nova etapa da viagem deparei-me com uma visão familiar:

Estes pequenos veículos com três rodas são comuns em grande parte dos países asiáticos, onde fazem as vezes de táxis. Conhecidos por tuc-tucs na Tailândia e Camboja, na Índia são chamados autos.

Mas os autos não serviam para me levar ao meu destino, era preciso um veículo mais possante. É que eu ia para o distrito de Nilgiris, as montanhas azuis, a mais de 2,400 metros de altitude. Durante os dias que se seguiriam as minhas viagens levar-me-iam a vários dos locais indicados no mapa, tais como Coonoor, Kotagiri, Ootacamund e Mudumalai.


Ver Mapa Maior

Eis aqui uma vista das montanhas azuis, algures na estrada de Coimbatore a Coonoor. A qualidade não é lá grande coisa, pois foi tirada de um veículo em andamento. Na altura nem me apercebi dos burros (mãe e cria) próximos do camião.


O meu destino para a noite era a capital do distrito de Nilgiris, Ooty (outro nome de Ootacamund). Tinha muito que subir, mais de três horas.

[Continua]

Ficha técnica
Mapas cortesia do GoogleMaps.
Todas as fotografias são da minha autoria (algo que se nota pela fraca qualidade), e podem ser utilizadas livremente.