sábado, julho 08, 2006

Mamutes louros e morenos

Tenho que mudar os nomes desta secção. Eu tendo a colocar os textos sobre criaturas vivas na "criatura do dia" e as coisas extintas no "fóssil do dia". Contudo muitas vezes os restos de criaturas desaparecidas não são propriamente fósseis, os tecidos originais ainda lá estão, e permitem mesmo pesquisas genéticas. Já falei aqui, aqui e aqui de algumas notícias referentes ao mamute lanudo, Mammuthus primigenius. Pois bem, uma outra acaba de sair. O interessante neste estudo é que pela primeira vez se conseguem tecer considerações sobre uma característica fenotípica de um animal extinto a partir do seu ADN. Qual a característica? [... ler mais]

Trata-se da cor do pêlo. Numa tradução livre do resumo do artigo de Holger Römpler e colegas na Science (ref1):

Através da amplificação do receptor de tipo 1 de melanocortina do mamute lanudo, descrevemos a sequência completa de nucleótidos de um gene codificado no núleo de uma espécie extinta. Encontrámos dois alelos e mostramos que um alelo produz uma proteína funcional enquanto o outro codifica uma proteína com actividade muito reduzida. Esta descoberta sugere que os mamutes poderiam ser polimórficos na cor da pelagem, com indivídos de pelagem clara e indivíduos de pelagem escura ocorrendo simultaneamente.

O artigo é muitíssimo curto. Os autores utilizaram material extraído de um osso encontrado na sibéria de um mamute com cerca de 43,000 anos e reconstruiram o receptor de tipo 1 de melanocortina (Mc1r). Verificaram que o animal era heterozigótico, isto é possuía duas variantes, uma delas produzindo uma proteína com actividade muito reduzida. A actividade reduzida no Mc1r resulta em cabelo ruivo nos seres humanos e vacas, e pelo ruivo ou louro em ratos, cavalos e cães. Para verificar que não se tratava de qualquer tipo de dano do ADN daquele exemplar os autores testaram mais animais e encontraram a mesma variante. Para além de animais com as duas variantes os autores encontraram alguns animais com apenas uma variante (homozigóticos). A existência de mamutes "morenos" e "louros" não é em sim uma grande surpresa. Na verdade, já se sabia, a partir de alguns animais encontrados em bom estado de preservação, que havia variabilidade na coloração dos mamutes. A presença de um indivíduo heterozigótico mostra que essa variação podia ocorrer na mesma população. O que este trabalho mostra pela primeira vez é que é possivel investigar características de espécies extintas a partir do seu ADN nuclear. É claro que já se está a ver qual o trabalho do mesmo tipo que se poderá fazer no futuro: o genoma do Homem de Neandertal. Seriam os neandertais louros, morenos ou ruivos?

Ficha técnica
O pequeno ícone no alto da contribuição pode ser encontrado numa versão muito maior nas páginas da livscience, mais exactamente neste artigo.

Referências
(ref1) Holger Römpler, Nadin Rohland, Carles Lalueza-Fox, Eske Willerslev, Tatyana Kuznetsova, Gernot Rabeder, Jaume Bertranpetit, Torsten Schöneberg, Michael Hofreiter (2006). Nuclear Gene Indicates Coat-Color Polymorphism in Mammoths. Science Vol. 313. no. 5783, p. 62. Laço DOI.

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