quinta-feira, novembro 02, 2006

Tocar na marca da Felicidade

Carregue nas setas para navegar ou no papagaio para ir para o início da série.

Como prometido, eis-me de volta às aventuras de uma fêmea, chamada Happy, de elefante asiático Elephas maximus, que gosta de se ver ao espelho. Como descrevi na primeira contribuição dedicada a este estudo de Joshua Plotnik e colegas, os elefantes face a um espelho seguiam os passos tradicionais dos indivíduos que identificam o reflexo como sendo a sua imagem: primeiro investigavam ao redor do espelho, em seguida faziam gestos para ver o equivalente no espelho. Este proedimento é claramente sugestivo de que os elefantes serão capazes do reconhecimento de si próprios num espelho (RsPE). Um teste mais poderoso, que se usa em primatas familiarizados com o espelho, consiste em colocar uma marca no animal num local onde ele habitualmente não a consegue ver. Se o primata ao olhar para o espelho tentar tocar na marca, essa é uma indicação conclusiva de que o animal compreende que a imagem é uma representação dele mesmo. Os elefantes possuem neste caso algo que os equipara aos primatas: uma tromba, que usam como orgão manipulador e lhes permite o equivalente ao tocar das mãos dos primatas. [... ler mais]

Foi esse teste que os investigadores fizeram aos elefantes:
Marcas visíveis e invisíveis foram aplicadas às cabeças dos elefantes para testar se eles passariam o "teste da marca" para o RsPE no qual um indivíduo usa, de forma espontânea, um espelho para tocar uma marca, de outra forma imperceptível, no seu corpo. Relatamos aqui um estudo com sucesso de RsPE em elefantes e relatamos paralelos marcantes entre a progressão nas respostas a espelhos entre os atnropóides, golfinhos, e elefantes. Estes paralelismos sugerem evolução cognitiva convergente, muito provavelmente relacionada com um sistema social complexo e cooperação.

Os investigadores pintaram na cabeça dos elefantes uma cruz na vizinhança de cada um dos olhos. As tintas eram idênticas em quase tudo (textura, cheiro) mas tinham uma diferença óbvia: uma era visível, a outra invisível. A utilização de duas marcas eram para ter a certeza de que o animal reagia a um estímulo visual. Eis aqui alguns fotogramas do filme que acompanha esta parte do artigo, que mostra a reacção da Happy. Ela começa por se mirar ao espelho:

Em seguida toca claramente na região da marca visível. Ela repete o processo várias vezes, tocando na marca ou perto da marca. Eis mais fotogramas em baixo mostrando duas sequências em que ela toca o rosto muito perto da marca:

As sequências são quase idênticas, e eu mostro abaixo mais duas sequências de toques para ilustrar um aspecto importante.

A Happy toca sempre apenas na região da marca visível, nunca tenta toques semelhantes no outro lado do rosto, mesmo quando está a ver esse lado do rosto no espelho. Os autores notam ainda que a Happy não mostrou predisposição para tocar na marca antes de ser colocada em frente ao espelho.

Apesar de estar provavelmente a fazer uma antropormofização indevida, não consigo deixar de pensar que a Happy se diverte com o que vê no espelho. Pelo menos é o que me ocorre quando vejo a sequência final do filme.

Eis aqui o filme correspondente a esta sequência (2.6Mbytes).

As duas colegas da Happy, a Patty e a Maxine não mostraram a mesma apetência por tocar na cruz branca. Isso não quer dizer que não tenham compreendido que o que veêm no espelho é um reflexo delas mesmas. É preciso notar que para os elefantes a visão não tem a mesma importância que para os primatas. Os outros elefantes provavelmente não deram grande importância à marca. Quem sabe, talvez sejam muito menos vaidosas que a Happy. O caso da Happy parece no entanto inequívoco: ela reconhece-se claramente ao espelho.

Como se refere nesta contribuição, os golfinhos também se reconhecem ao espelho. Pode no entanto parecer estranho fazer um teste da marca a criaturas sem mãos ou sem tromba. Um exemplo, que mostra como nos golfinhos as coisas são também claras, é dado por um dos autores deste estudo, Frans B. M. de Waal, nos seus comentários a um artigo de que falarei aqui em breve:
Mas será isto realmente comparável às acções de Presley, um golfinho do Aquário de Nova Iorque, que, sem quaisquer recompensas, reagiu, ao ser marcado com tinta, arrancando a alta velocidade para uma parte distante do seu tanque onde estava montado um espelho? Aí ele andou à roda, da mesma forma que fazemos numa sala de provas de roupa, parecendo procurar ver como tinha ficado.

Ainda tenho alguns artigos a ler, mas voltarei seguramente ao tema da inteligência animal, da próxima vez sobre os golfinhos.

Referências
(ref1) Joshua M. Plotnik, Frans B. M. de Waal, and Diana Reiss (2006). Self-recognition in an Asian elephant. Proc. Natl. Acad. Sci. USA, Laço DOI.

0 comentários: