sábado, março 31, 2007

O sono leve das mães

Este pequeno animal, infelizmente catalogado como vulnerável à extinção, é um mico-estrela, de seu nome científico Callithrix kuhlii. Trata-se de uma criatura relativamente pequena, pesando entre 350 a 400 gramas, com unhas que se assemelham a garras, e polegares não oponíveis. Vive nas florestas tropicais da América do Sul, incluindo o Brasil, em pequenos bandos com uma média de 7 elementos, formados por uma fêmea dominante, algumas fêmeas subordinadas, e com um número de machos aproximadamente metade do de fêmeas. Os micos-estrelas dão à luz duas vezes por ano, nascendo as crias sempre aos pares, após um período de gestação de 150 a 160 dias. A fêmea dominante é a unica a dar à luz, mas todos os membros do grupo colaboram no cuidado dos jovens. Os machos, por exemplo, colaboram carregando as crias enquanto a mãe se alimenta. Só que quando o Sol se põe quem tem que aturar os pequenitos é a mãe. Não é que os micos machos sejam maus pais, mas o sono deles é sagrado. [... ler mais]

O estudo dos estados de sono dos pais e mães micos é descrito num artigo de Jeffrey Fite e colegas na revista International Journal of Primatology (ref1). Numa tradução livre do resumo:

Progenitores e crias dormindo juntamente é algo que ocorre em primatas humanos e não humanos, contudo os estudos do impacto nos padrões de sono dos progenitores têm-se limitado a mães humanas. Examinámos os efeitos de dormir em conjunto na vigília nocturna de um primata do novo mundo, com duas crias, o mico-estrela (Callithrix kuhlii). Comparámos os padrões de sono de progenitores micos cuidando de crias, com os daqueles sem crias, usando uma câmera video de 8 mm sob iluminação infravermelha.

Os resultados mostram o que é realmente o amor de mãe versus o sono de pai:
A presença de crias pequenas teve um impacto significativo no sono das mães mas não no dos pais. De facto, as mãe que criavam crias jovens acordavam com uma frequência mais de três vezes maior que as mães sem crias. Examinámos também a vigília nocturna de progenitores micos durante as primeiras nove semanas de vida das crias (nascimento até ao desmame). Embora as mães tendam a reduzir de forma significativa o seu investimento diurno na sua progenitura muito cedo na vida das crias ao entregarem o cuidado das crias aos pais e outros membros do grupo, a maior vigília nocturna das mães não se limitava ao período logo após o parto. Em vez disso, as mães exibiam maior vigília nocturna que os pais durante as 9 primeiras semanas de vida das crias. Os nossos resultados indicam que a presença das crias tem um impacto maior nos padrões de sono das mães Callithrix kuhlii que nos dos pais, sugerindo que as mães estão mais envolvidas no cuidado das crias do que se pensava anteriormente e que os pais não estão tão envolvidos nos cuidados nocturnos como o seu comportamento durante o dia poderia sugerir.

Este trabalho é apenas uma introdução a estas criaturinhas. É que um trabalho recente mostra algo muito desconcertante nestes seres. Ao acasalar um macho pode estar a gerar crias que são, não seus filhos, mas sim seus sobrinhos. Falarei disso amanhã.

Ficha técnica
Imagem de mico-estrela obtida a partir das páginas do Callitrichid Research Center da University of Nebraska Omaha.

Referências
(ref1) Jeffrey E. Fite, Jeffrey A. French, Kimberly J. Patera, Elizabeth C. Hopkins, Michael Rukstalis, Heather A. Jensen, and Corinna N. Ross (2003). Nighttime wakefulness associated with infant rearing in Callithrix kuhlii. International Journal of Primatology, vol. 24, no6, pp. 1267-1280.

1 comentários:

Anónimo disse...

Callithrix kuhlii é endêmico do sul da Bahia, ou seja só ocorre em uma pequena faixa (23.000 km2)dentro do Brasil. Atualmente é classificado como não-ameaçado de acordo com a IUCN.