Esta é uma das aves mais raras do mundo. Nativa das florestas do Peru, nas encostas dos Andes, de seu nome científico Xenoglaux loweryi, é também um dos mais pequenos membros da família dos mochos e das corujas. Mede cerca de 10 centímetros de comprimento. Não tenho a certeza de qual o nome a dar-lhe em portugês, mas em castelhano encontrei duas designações. Uma, mais rara, é Lechucita Bigotona, que se poderia traduzir por corujinha bigoduda. A mais comum é Mochuelo Peludo, ou seja o mochito peludo. Confesso que prefiro a segunda e vou utilizá-la no que se segue. O aspecto do animal faz recordar vagamente um bufo-real, pois tal como ele aparenta ter "orelhas" nos cantos no alto da cabeça. Só que no mochito peludo essas coisas são extensões de plumas que tem debaixo dos olhos, os tais bigodes da corujinha bigoduda. Este animal foi visto pela primeira vez em 1976, capturado em redes. Apesar de muitas horas dedicadas a essa tarefa por ornitólogos profissionais e entusiastas da observação das aves, durante mais de 30 anos não foi observado na sua labuta diária num ambiente natural. [... ler mais]
A descoberta de 1976 merece ser contada em algum detalhe pois o artigo que a descreve, da autoria de John O'Neill & Gary Graves, na revista Auk (ref1), tem pormenores interessantíssimos. Assim numa tradução livre de um excerto do interior do artigo:Chegámos ao local do nosso acampamento numa chuvada intensa que continuou a cair durante mais de 36 horas. Durante este período o nosso assistente de campo, Manuel Sanchez,conseguiu colocar oito redes. Ele verificou as redes com frequência mas não apanhou nada. Os membros da nossa expedição conferenciaram e deicdiram que se não capturássemos nenhuns pássaros no nosso terceiro dia devíamos deslocar-nos para um outro local, de preferência mais seco.
Ainda bem que decidiram aguardar:Fomos tomados pela mais completa surpresa quando na manhã desse terceiro dia, Sanchez regressou e abriu um saco que ele disse conter um mocho. A ave no saco era de facto um mocho mas completamente diferente de qualquer coisa que qualquer de nós jamais tivesse visto. Era um pequeno mocho de pernas nuas sem tufos nas orelhas. O O'Neill teve a impressão imediata de que «tinha a forma de um Otus, o tamanho de Glaucidium, e a cor de um Lophostrix.» Até hoje, este pequeno mocho permanece para nós tão excitante como era naquele dia chuvoso no Peru.
Deve ser de facto uma sensação maravilhosa descobrir algo tão peculiar.Os três exemplares conhecidos, duas fêmeas e um macho, possuem uma combinação de características que impossibilitam a sua colocação em qualquer género conhecido. Para este pequeno mocho propomos o nome genérico Xenoglaux.
Este nome quer dizer "coruja estranha", e é bastante adequado. Eis aqui uma aguarela de um dos autores do artigo baseada nas observações dessa primeira expedição. Notem os olhos de um vermelho profundo, e a forma como os bigodes dão a ilusão de orelhas.
Ora por que razão é que eu estou a falar hoje neste animal? Trata-se de uma criatura interessante e não seria preciso nenhum motivo especial para me lembrar dela, mas há de facto uma razão. Enquanto lia o excelente blog Rigor Vitae: Life Unyielding de Carel Brest van Kempen, descobri que o Carel tinha sido um dos tais entusiastas que tinham andado pelo Peru em busca deste tímido animal. Embora não o tenha conseguido observar, a partir de descrições e da observação de alguns casacos de penas fez uma belíssima pintura que pode ser vista na sua contribuição The Strange Owlet. Fiquei também a saber que finalmente alguém tinha observado tão tímida criatura sem ser em resultado de uma captura. Eis aqui uma foto desta expedição que nos permite avaliar o tamanho do animal:
As cores estão um pouco esbatidas nesta fotografia, o que me dá uma desculpa para mostrar uma outra imagem:
O mocho peludo vive numa área muito pequena nas florestas do Peru, área essa que até há pouco tempo não era protegida. As autoridades peruanas resolveram por isso criar a Reserva Privada de Abra Patrícia, com 1500 hectares, para proteger este animal. Foi aí que David Geale e Juvenal Ccahuana, cuja função é monitorizar a reserva, observaram pela primeira vez, no mês passado, por três vezes, animais movendo-se livremente no seu ambiente natural, e gravaram alguns dos seus chamamentos.
Mas nem tudo são boas notícias no que se refere a tão simpática se bem que estranha criatura. A reserva até há pouco tempo existia sobretudo no papel e os animais enfrentam muitas ameaças. Poderão não existir mais de 250 destes mochos esquisitos, provavelmente não mais de um milhar. Com esta observação e o interesse que despertou talvez as coisas melhorem
Ficha técnica
As duas últimas imagens são cortesia da Asociación Ecosistemas Andinos (ECOAN). Essas imagens e alguma da inspiração para o texto foram retirados do comunicado de imprensa no ABCbirds.
Referências
(ref1) John O'Neill & Gary Graves (1977). A new genus and species of owl (Aves:Strigidae) from Peu. The Auk 94, 409:416.
quarta-feira, março 28, 2007
O mocho esquisito
Por CDG laço permanente
Etiquetas: Biologia
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
1 comentários:
essa coruja é a coisa mais linda que eu já vi em toda minha vida realmente ela é uma coisa maravilhosa da natureza.vania
Enviar um comentário