sexta-feira, março 07, 2008

Querido, esquece as prendas, faz-te é de morto

Esta é uma aranha-lobo, da espécie Pisaura mirabilis. Trata-se de uma fêmea que, no comportamento característico da espécie, carrega um enorme casulo cheio dos seus ovos. Para chegar a esta situação a fêmea teve que acasalar com pelo menos um macho. Ora nesta, com em muitas outras espécies de aranhas, isso significa que o macho corre o risco de, em vez de um encontro amoroso, ser convidado para o jantar, só que como refeição. Os machos da espécie desenvolveram formas de minimizar os riscos, oferecendo como prendas às fêmeas animais envoltos em fios de seda. Outro dos comportamentos observados nos machos face às fêmeas é fingirem-se de mortos. Esse é um comportamento visto noutras espécies na natureza, quando face a predadores. Os cientistas questionavam-se, contudo, se não existiria algo mais por trás deste fingir de morto, algo cujo contexto fosse essencialmente sexual. Medo ou sedução? [... ler mais]

O estudo que trata das preferências amorosas destas aranhas é da autoria de Line Hansena e colegas e foi publicado na revista Behavioral Ecology (ref1). Numa tradução livre do resumo:

Os machos e as fêmeas enfrentam muitas vezes óptimos diferentes na taxa de acasalamento, o que pode causar a evolução da resistência das fêmeas ao acasalamento, e a contra-adaptações nos machos para aumentarem a taxa de acasalamento. Os machos da aranha Pisaura mirabilis possuem um comportamento de acasalamento espectacular que envolve uma prenda nupcial e tanatose (fingimento da morte). A tanatose num contexto sexual é algo de excepcional e foi sugerido que funcionaria como uma estratégia antipredação face a fêmeas potencialmente canibalísticas. Se a tanatose serve como uma estratégia de protecção, os machos deviam fingir a morte em resposta à agressão das fêmeas ou quando estivessem mais vulneráveis a um ataque.

Como é costume estas coisas envolvem uma ablaçãozita:
Testámos estas previsões envolvendo vários factores: machos que foram diminuídos (removeu-se uma pata), e logo vulneráveis, e machos de controlo, foram emparelhados com fêmeas, que eram mais ou menos intrinsecamente agressivas (mediu-se em relação às presas). Nas tentativas de acasalamento, registámos a tendência dos machos para fingirem a morte, o sucesso na cópula, e a duração da cópula. Além disso, investigámos o efeito do estado de acasalamento das fêmeas (virgens ou já tendo acasalado) nessas componentes do acasalamento dos machos. As fêmeas intrinsecamente agressivas mostraram maior agressividade em relação aos machos.

Portanto, os autores conseguiram arranjar todas a condições para o teste: machos mais ou menos vulneráveis, fêmeas mais ou menos agressivas. Os resultados?
Nem a agressividade das fêmeas, nem o seu estado de acasalamento, nem a vulnerabilidade dos machos aumentaram a propensão dos machos para efectuar a tanatose. Em vez disso, os machos que fingiam a morte tinham maior sucesso na obtenção de cópulas e ganhavam acesso a cópulas mais longas. Logo, os nossos resultados sugerem que a tanatose funciona como uma estratégia adaptativa dos machos para ultrapassar a resistência das fêmeas. Todos os machos foram capazes de efectuar a tanatose embora alguns machos a usem de forma mais frequente que outros, sugerindo um custo no fingimento da morte que mantém a variação da tanatose durante a corte.

O sucesso para uma boa vida amorosa por parte dos machos é fingir-se de morto. Pelo menos na Pisaura mirabilis.

Ficha técnica
Imagem cortesia de Katarina Paunovic via Wikimedia Commons.

Referências
(ref1) Line Spinner Hansena, Sofia Fernandez Gonzalesa, Søren Tofta and Trine Bilde (2008). Thanatosis as an adaptive male mating strategy in the nuptial gift–giving spider Pisaura mirabilis. Behavioral Ecology. doi:10.1093/beheco/arm165.

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