A descoberta foi anunciada ao mundo num artigo de Peter Brown e colegas na revista Nature (ref1). Numa tradução livre do resumo:Hoje em dia aceita-se geralmente que um único género de hominines, o Homo, estava presente no Pleistocénico da Ásia, representado por duas espécies, Homo erectus e Homo sapiens. Ambas as espécies são caracterizadas por um maior tamanho do cérebro, maior altura corporal e dentes menores relativamente ao Australopithecus do Pliocénico da África. Relatamos aqui a descoberta, do Pleistocénico das Flores, Indonésia, de um hominíneo adulto com estatura e capacidade craniana de respectivamente 1 metro e 380 centímetros cúbicos, iguais aos mais pequenos austrolopitecíneos conhecidos. A combinação de características primitivas e derivadas coloca este hominíneo numa nova espécie, Homo floresiensis. A explicação mais provável para a sua existência nas Flores é o isolamente prolongado, com o subsequente nanismo insular endémico, de uma população ancestral de H. erectus. O H. floresiensis mostra que o género Homo é mais variado do ponto de vista morfológico e mais flexível nas suas respostas adaptativas do que se julgava anteriormente.
Na verdade tratava-se de uma hominínea, adulta, com o tamanho de uma criança moderna de cerca de 3 anos de idade. O mais espantoso nesta pequena senhora das Flores até nem é a altura, o que surpreende mesmo é a capacidade craniana. As populações humanas modernas de pequena estatura, como os pigmeus, têm um cérebro com tamanho comparável ao de populações de maior estatura. Isso tem a ver com a forma como se dá a redução de tamanho, por paragem do crescimento durante a puberdade. Com um cérebro cerca de três vezes menor que o do um H. erectus, o H. floresiensis não pode ser simplesmente o equivalente de um pigmeu para o erectus. Os autores propõem um outro mecanismo, o chamado nanismo insular. Muitas espécies de animais de grande porte mostram uma evolução para formas menores, ao longo do tempo, quando ficam restringidos a ilhas. Por exemplo, muitas das ilhas do Mediterrâneo albergaram até recentemente populações de elefantes que, quando adultos, eram mais pequenos que um burro.
Mesmo admitindo que se trata de nanismo insular, a redução de tamanho é apesar de tudo demasiada. Um ser humano moderno tem aquilo a que se chama um coeficiente de encefalização de 6, ou seja um cérebro que é cerca de 6 vezes maior do que o esperado para um mamífero do seu tamanho. O Homo erectus tinha 4 como coeficiente de encefalização. Ora o Homo floresiensis tinha uma encefalização entre 2.5 e 3, comparável aos chimpanzés e hominídeos primitivos como o Australopithecus. Ou seja, admitindo uma origem relacionada com o H. erectus, o H. floresiensis teria seguido algo não anteriormente observado na evolução humana: a diminuição das capacidades cerebrais. Este é um dos aspectos significativos da história e está em grande parte por detrás da polémica que abordarei em contribuições posteriores.
A pequena senhora das Flores tinha um tamanho e uma capacidade craniana comparáveis ao Australopithecus. Por que razão é então incluída no nosso género? Porque não num género próprio, sei lá, Floresianthropus? Os autores notam alguns aspectos do esqueleto que parecem apontar a pertença ao género Homo. Para além disso há a capacidade de cruzar o oceano para chegar à ilha. Na gruta onde foram encontrados os ossos dos floresiensis existem também vestígios de fogo, e utensílios de pedra contemporâneos desses mesmos ossos. Há ainda a questão da idade dos vestígios, e essa foi também uma enorme surpresa. Abordarei todos esses aspectos nas contribuições que se seguem, a começar pela questão da datação dos vestígios.
Referências
(ref1) Brown P., et al (2004). A new small-bodied hominin from the Late Pleistocene of Flores, Indonesia. Nature 431, 1055-1061. Laço DOI.
domingo, dezembro 03, 2006
O Mundo do Hobbit: a pequena senhora das Flores
Por CDG laço permanente
Etiquetas: Antropologia
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