domingo, setembro 10, 2006

Coimbra tem mais encanto... e criacionistas!

Continuo de férias, mas o choque foi tão grande que ainda me sinto apalermado e tinha que colocar isto aqui. O tema do mês na Roda de Ciência é "Internet na Academia e a divulgação da Ciência". Eu pensava não ter tempo para contribuir com algo de jeito, pelo que isto veio de certa forma a calhar. Uma das questões, que pelos vistos não ocorreu aos proponentes do tema, é que os meios académicos não incluem apenas ciência, e podem, por vezes, ser mesmo hostis a certos aspectos da ciência. Este caso veio mostrar isso de forma algo dolorosa. Um jornal português, da imprensa supostamente séria, sentiu a necessidade de publicar uma carta aberta de um indivíduo que defende as teses criacionistas. Nem me atrevo a contaminar este blog com o título desse pasquim, que não voltarei a comprar. O que me deixou realmente aparvalhado foi descobrir que há um feudo criacionista numa vetusta universidade portuguesa. [... ler mais]

Eis uma das pérolas desse texto:

Os criacionistas mostram que as mutações acumuladas, além de não criarem informação genética nova, destroem o genoma. As mutações e a selecção natural operam em informação genética preexistente, estando longe de explicar a origem da vida e a transformação de moléculas em pessoas.

Eis outra:
Os fósseis e as rochas não trazem inscrita a sua antiguidade. Os evolucionistas datam as rochas e os fósseis de acordo com as premissas naturalistas, evolucionistas e uniformitaristas de que partem, impossíveis de validar quanto ao passado distante. As quantidades de isótopos são medidas no presente por cientistas no presente.

Mais uma:
Se milhões de espécies animais tivessem evoluído ao longo de milhões de anos, deveríamos encontrar biliões de fósseis intermédios e não apenas a mão-cheia de exemplos altamente controversos (v.g. Archaeopteryx) com que nos deparamos.

O que eu realmente adoro é esta aqui:
Os criacionistas também estudam biologia, genética, astronomia, astrofísica, geologia, antropologia, paleontologia, etc. Apenas entendem que nessas disciplinas a evolução naturalista é a premissa de que se parte e não a conclusão a que necessariamente se chega depois de seriamente analisadas as evidências. As leis da causalidade, da termodinâmica, da biogénese, das probabilidades, etc., e o princípio antrópico corroboram a criação e não a evolução.

Ao pesquisar na internet encontrei um blog, A Memória Inventada, de Vasco Barreto, que discute aqui esse texto. O jornal em questão não é de consulta livre, mas Vasco Barreto faz uma citação completa do artigo. O autor do texto é Professor de Direito na Universidade de Coimbra, e pelos vistos não é caso único. Se no meio académico a ciência é considerada com um tal desprezo o que esperar do público em geral? Antes de considerar o aspecto da internet na Academia e divulgação da ciência, talvez seja preciso começar pela divulgação da ciência na própria Academia.

Adenda: comentários sobre o mesmo tema na Blogómica.
Adenda: com uma paciência que invejo, Vasco Barreto resolveu rebater algumas das distorções e falsidades dos criacionistas. Ver aqui, e no seu outro blog. Eu continuo a achar que a investida criacionista se trata de uma tentativa de conseguir algum reconhecimento mediático com a promessa de polémica como engodo para os jornais. Mas não vejo interesse na opinião pública, parece interessar menos as pessoas que aquelas iniciativas em que grupos de poucas dezenas de manifestantes se despem para atrair as atenções dos jornais.

Comentários (via Roda de Ciência).